Lei 15.040/24: as principais mudanças no mercado de seguros e os impactos para o consumidor
- jeancaristina
- 14 de nov.
- 5 min de leitura
Novo Marco Legal dos Seguros e as principais mudanças que impactarão a vida dos consumidores
A promulgação da Lei nº 15.040/24 representa uma reestruturação expressiva das relações contratuais no mercado segurador brasileiro. Após décadas em que muitas das práticas permaneciam guiadas por padrões tacitamente estabelecidos ou pela jurisprudência, a nova lei define regras mais rígidas sobre prazos, transparência, cancelamento e renovação de seguros.
Para o consumidor, tais mudanças oferecem não apenas maior segurança jurídica mas também proteção reforçada.
É relevante que segurados, potenciais contratantes e operadores dessa indústria compreendam os efeitos práticos dessas mudanças. A nova normativa se mostra especialmente útil para mitigar práticas abusivas, reduzir inseguranças e estabelecer obrigações claras para as seguradoras.
A seguir, apresenta-se uma análise detalhada dos principais pontos da Lei nº 15.040/24 e seus impactos.
Principais mudanças trazidas pela Lei nº 15.040/24
Transparência contratual reforçada
Uma inovação substancial é a obrigação das seguradoras representarem formalmente o contrato ao segurado. A nova lei determina que a apólice — ou documento equivalente — deve ser entregue em até 30 dias após a aceitação da proposta, em linguagem clara e acessível, com explicitação dos riscos, exclusões, carências e procedimentos para acionamento.
Essa medida reforça os direitos de informação assegurados pelo próprio Código de Defesa do Consumidor, garantindo que as cláusulas limitativas sejam compreensíveis. A mudança também reflete entendimento jurisprudencial consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, que já decidiu em reiterados casos que cláusulas ambíguas ou ocultas deverão ser interpretadas em favor do segurado.
Adicionalmente, a nova lei formaliza o dever de transparência, obrigando a seguradora a prestar informações essenciais desde o momento da contratação até a vigência do contrato.
Prazos legais para proposta e sinistro
A Lei nº 15.040/24 fixa prazos legais rigorosos para as seguradoras se manifestarem sobre propostas de seguro e sinistros:
Propostas: a seguradora tem 25 dias para aceitar ou recusar formalmente uma proposta. Se não se manifestar dentro desse prazo, a proposta é considerada aceita por “aceitação tácita”.
Sinistros: uma vez entregada a documentação solicitada pela seguradora, esta tem até 30 dias para decidir sobre o pagamento da indenização.
A “aceitação tácita” representa uma proteção muito relevante para o consumidor, especialmente diante de situações em que a seguradora simplesmente não responde, deixando o proponente em limbo. Já o prazo para sinistros obedece a lógica de eficiência e previsibilidade: antes, a demora injustificada na análise e pagamento era uma das queixas mais recorrentes entre segurados.
Cancelamento unilateral restrito
A nova lei proíbe a rescisão unilateral por parte da seguradora, a menos que haja previsão legal expressa ou justa causa fundamentada — como comportamento fraudulento ou descumprimento contratual significativo por parte do segurado.
Essa regra fornece uma barreira legal contra cancelamentos abruptos, comunicados sem antecedência ou motivação. Para reforçar a proteção, a lei adota os princípios de boa-fé objetiva e confiança legítima: a seguradora deverá fundamentar sua decisão se optar por rescindir o contrato.
O Código de Defesa do Consumidor veda cláusulas que impõem obrigações consideradas abusivas ou criam vantagem excessiva para o fornecedor. A Lei nº 15.040/24 reforça esse comando, exigindo que eventuais cancelamentos sigam critérios justos e formais. Ademais, esse entendimento encontra respaldo em jurisprudência do STJ, que já decidiu pela abusividade de recusa de renovação em contratos de longa duração, especialmente seguros de vida.
Renovação automática mais protegida
Para seguros de longa duração, a lei introduz uma regra importante: após dez anos de renovações consecutivas, a seguradora deve oferecer ao segurado a continuidade do contrato sob condições semelhantes, sem impor novas carências ou exigir condições desproporcionais.
Essa disposição protege contratantes que mantêm o seguro por muitos anos e que poderiam ser penalizados arbitrariamente em uma renovação por critérios internos da empresa. A norma atende ao princípio de função social do contrato e reforça a boa-fé: a seguradora não pode descartar uma relação antiga apenas por interesses comerciais.
Esse tema, por sinal, é recorrente na jurisprudência do STJ, especialmente quando se examina a responsabilidade contratual de seguradoras em contratos de longo prazo.
Harmonia com o Código de Defesa do Consumidor
A Lei nº 15.040/24 não substitui o CDC; ela se soma ao rol de mecanismos de proteção já previstos na legislação consumerista. Muitas de suas disposições podem ser entendidas como operacionalizações específicas de princípios gerais constantes no CDC, como transparência, equilíbrio contratual, boa-fé e vulnerabilidade do consumidor.
Por exemplo: o artigo 47 do CDC dispõe que cláusulas ambíguas devem ser interpretadas a favor do consumidor — premissa que agora se reflete diretamente nas exigências de redação clara e entrega de apólice. Essa convergência entre a nova lei e o CDC tende a tornar as relações de seguro menos litigiosas e mais previsíveis, beneficiando consumidores e também fortalecendo a confiança no mercado segurador.
Impactos práticos para segurados e para o mercado
Para os segurados:
Maior previsibilidade: com prazos legais para resposta de proposta e sinistro, o segurado saberá quando esperar uma manifestação da seguradora.
Segurança contratual: a obrigação de entregar a apólice formaliza os compromissos, reduz ambiguidades e facilita a prova de cobertura.
Proteção contra cancelamentos arbitrários: o consumidor fica menos vulnerável à decisão unilateral da seguradora.
Valorização de contratos antigos: seguros com longa vigência terão proteção especial para renovação.
Redução de litígios: regras mais objetivas tendem a evitar disputas judiciais, reclamações em órgãos de defesa do consumidor e atrasos injustificados.
Para o mercado segurador:
As seguradoras precisarão ajustar seus processos internos para cumprir os novos prazos, revisar contratos e adotar fluxos de atendimento mais eficientes.
Haverá investimentos em tecnologia e compliance: para garantir que o envio de apólices e a manifestação sobre propostas/sinistros obedeçam aos prazos legais.
Possível aumento de credibilidade: consumidores mais confiantes poderão contratar com maior frequência, e a reputação das empresas será afetada positivamente se elas cumprirem as novas regras.
Competitividade regulatória: empresas mais bem estruturadas e ágeis podem se destacar, atraindo segurados com ofertas transparentes e confiáveis.
Desafios e riscos
Apesar dos benefícios, alguns desafios devem ser observados:
Capacidade operacional: seguradoras menores ou com menos estrutura podem ter dificuldade para se adaptar aos prazos e às exigências de transparência.
Fiscalização: será necessário um regime robusto de fiscalização (SUSEP, órgãos de defesa do consumidor) para garantir o cumprimento das regras.
Controvérsias interpretativas: algumas cláusulas específicas podem gerar dúvidas sobre o que configura “justa causa” para cancelamento ou renovação; a jurisprudência provavelmente precisará amadurecer.
Repasse de custos: há risco de que seguradoras repassem parte dos custos de compliance para os consumidores por meio de aumento de prêmios.
Educação do consumidor: muitos segurados talvez não conheçam seus novos direitos, exigindo campanhas informativas por parte de reguladores, associações de consumidores e até mesmo escritórios especializados.
Considerações finais
A Lei nº 15.040/24 inaugura uma nova fase no mercado de seguros brasileiro, marcada por maior equilíbrio, transparência e proteção ao consumidor. Ao transformar boas práticas muitas vezes consolidadas em dever legal, o novo marco fortalece a segurança nas relações contratuais e confere previsibilidade tanto para o segurado quanto para a seguradora.
Para os consumidores, é momento de ficar atento: é importante verificar contratos, exigir a apólice no prazo legal, acompanhar a evolução dos sinistros e assegurar que seus direitos sejam respeitados. Ao mesmo tempo, é fundamental que as seguradoras invistam em processos eficientes, tecnologia e compliance para operar conforme as novas exigências.



