123milhas entra com pedido de recuperação judicial. O caso Hurb, e mais.

A 123milhas protocolou pedido de recuperação na Justiça do Estado de Minas Gerais. O que os consumidores devem esperar. O que leva uma empresa tão grande à insolvência em tão curto espaço de tempo?

A 123milhas protocolou pedido de recuperação judicial nesta terça-feira, 29, na 1ª Vara Empresarial da Comarca de Belo Horizonte.

Se aprovado o pedido, o procedimento resultará na suspensão das ações legais por um período de 180 dias para o site de vendas de pacotes de viagens e passagens aéreas.

Um dia antes, a empresa já havia anunciado um plano de reestruturação, que culminou em demissões. Não se sabe ao certo o número de funcionários demitidos. Porém, os números são alarmantes.

Segundo a empresa, a dívida atual é de R$ 2,3 bilhões.

Em 18 de agosto a 123milhas comunicou sua decisão de interromper a venda de pacotes turísticos flexíveis, modelo semelhante ao utilizado pela Hurb, que também enfrenta dificuldades e provavelmente irá para o mesmo caminho.

Agora, com recuperação judicial distribuída, as ações ficam suspensas por um prazo inicial de 180 dias. Neste período, os consumidores não conseguirão reaver seu dinheiro ou ter as passagens expedidas, mesmo aqueles que aceitaram o recebimento do voucher.

O pedido de recuperação também abrange a Art Viagens (Hotmilhas) e a Novum, holding detentora do capital das empresas.

Caso seja aprovado o plano de recuperação, a empresa apresentará uma proposta para pagamento de seus credores, que diga-se de passagem, são muitos. Há dívidas fiscais, bancárias, com fornecedores (companhias aéreas, hotéis etc.), empregados e consumidores.

Não há perspectiva de que os consumidores consigam exercer seu direito em curto espaço de tempo.

Agora, o que resta é ter calma e ficar atento às informações prestadas pela empresa, pois o pedido de recuperação, como dissemos, pode demorar a princípio 180 dias, sem nenhuma previsão de que algo de mais importante ocorrerá nestes 6 primeiros meses de tramitação.

Hurb e 123milhas: sua abrangência é, agora, sua maior vilã

Algumas empresas demoram anos para entrar em estado de insolvência. Outras conseguem este feito em dias ou semanas. A velocidade com que a crise alcança uma ou outra está ligada essencialmente ao tipo de negócio. Em alguns setores, a exemplo do turismo, ocorre o chamado efeito manada, em que a mera hipótese de crise se espalha pela internet na velocidade do vento e em questão de instantes toda a sua base de clientes já está tomando medidas para assegurar sua viagem. E isto basta para a decretação de morte da empresa.

É o que ocorreu com as agências de turismo Hurb e 123milhas, que possuem uma larga fatia do mercado brasileiro de turismo e viagens, naturalmente muito sensível a notícias. Por serem digitais e terem uma proposta de negócio baseado exclusivamente em tecnologia, tais empresas não possuem ativos capazes de garantir seus muitos credores espalhados por todos os cantos do país.

Diferentemente de empresas de comércio eletrônico, por exemplo, que na pior das hipóteses conseguem se desfazer de seu estoque comercializando-o a preço de custo ou, não possuindo estoque podem simplesmente parar de operar sem nenhum custo agregado, as agências de turismo que se assemelham ao modelo de negócio da Hurb e 123milhas não têm estoque. Seu produto pertence integralmente a terceiros (companhias de transporte aéreo, terrestre ou marítimo e rede hoteleira) e a elas cabe apenas a intermediação financeira, ou seja, elas recebem de seus clientes e repassam aos fornecedores. São prestadoras de serviço apenas, e por isso mesmo não possuem aeronaves, ônibus, hotéis etc. Em síntese, elas não têm bens para garantir seus credores.

Justamente por serem do setor de viagens, os consumidores são muito mais sensíveis a qualquer tipo de notícia, recorrendo a órgãos de proteção de crédito quase que imediatamente, diante da menor possibilidade de não conseguirem viajar ou receber de volta os valores pagos. O consumidor de turismo faz planejamento da viagem. Olha o hotel, lê comentários de outros turistas, planeja férias junto com familiares, enfim, a viagem não é um simples produto, mas a realização de um sonho.

A abrangência territorial de empresas como Hurb e 123milhas torna qualquer estratégia mais difícil, deixando-as mais vulneráveis em momentos de crise. Aquilo que as tornou tão grandes, ou seja, sua tecnologia capaz de atender consumidores de todo o país, agora obriga que elas respondam ações e notificações vindas de toda parte. Vale lembrar que pela sistemática do Direito do Consumidor a ação poderá ser proposta no domicílio do consumidor, esteja ele onde estiver, tornando a defesa da empresa bem mais custosa.

O pedido de recuperação da 123milhas não espanta. Era o mínimo que podia fazer para “estancar a sangria”. Há dados de que foram distribuídas nos últimos dias 4 ações por hora contra a empresa e, repita-se, em todo o território nacional. Nem mesmo o melhor estrategista ou o escritório mais bem estruturado consegue dar conta de tal demanda. Com a recuperação em curso, as ações ficam suspensas, os pedidos de bloqueio ficam suspensos e tudo o que for relativo ao conglomerado passa a ser tratado em local único, com decisões que atenderão a todos os interessados, de forma uniforme.