123milhas cancela pacotes promocionais para setembro a dezembro de 2023
- jeancaristina
- 21 de ago. de 2023
- 5 min de leitura
Atualizado: 5 de abr. de 2024
A agência de viagens 123milhas comunicou o cancelamento da emissão de passagens PROMO previstas para setembro a dezembro deste ano. Entenda o caso e veja quais as opções do consumidor.
A 123milhas anunciou a suspensão das vendas da linha promocional (PROMO) com embarque previsto de setembro a dezembro de 2023, sob alegação de circunstâncias adversas no mercado.
Não só suspendeu novas vendas, como também informou aos consumidores que não cumprirá o contrato em relação às vendas já realizadas.
Em nota, a companhia disse o seguinte:
Devido à persistência de circunstâncias de mercado adversas, alheias à nossa vontade, a linha PROMO foi suspensa temporariamente e não emitiremos as passagens com embarque previsto de setembro a dezembro de 2023.
Estamos devolvendo integralmente os valores pagos pelos clientes, em vouchers acrescidos de correção monetária de 150% do CDI, acima da inflação e dos juros de mercado, para compra de quaisquer passagens, hotéis e pacotes na 123milhas.
Nós entendemos que essa mudança é inesperada e lamentamos o inconveniente que isso possa causar. Para nós, manter a sua confiança é o mais importante. Por isso, estamos fazendo o possível para minimizar as consequências deste imprevisto.
A linha promocional (PROMO) possuía a mesma característica dos pacotes comercializados pela Hurb, isto é, são pacotes promocionais encontrados por algoritmos que tentam predizer o valor futuro, a partir de dados passados, ou seja, uma espécie de adivinhação do valor que o consumidor encontrará no mercado, baseado em comportamento passado e presente do preço.
A Hurb fez isso durante a pandemia, tentando adivinhar o final da crise sanitária, emitindo passagens a preços incompatíveis, certa de que seus algoritmos estavam corretos quanto ao valor futuro. No entanto, a crise sanitária se estendeu e os preços saíram do controle. Os algoritmos da Hurb não conseguiram predizer a guerra, a inflação, o fim da pandemia e outros elementos inerentes ao preço e, simplesmente, entrou na maior crise de sua história.
A 123milhas estava indo na mesma direção. Sem conseguir determinar os preços futuros de voos e pacotes, seus algoritmos perderam para as indefinições do mercado e, antes que tomasse o mesmo rumo da Hurb, preferiu cancelar os contratos vigentes e suspender a comercialização de pacotes para o final do ano de 2023.
Os acertos e os erros da 123milhas
A decisão de suspender a comercialização de novos pacotes promocionais foi acertada.
Diante da possível dificuldade de seus algoritmos em determinar o preço futuro das viagens, nada melhor do que parar, analisar e tomar uma decisão que preserve a própria sustentabilidade da empresa.
Já a decisão de devolver aos consumidores os valores pagos através de vouchers, por melhor que pareça, não é a mais adequada, pois se trata de uma via única, que não é admitida no Direito do Consumidor.
A escolha da forma é do consumidor, e não da empresa. O consumidor não pode ser obrigado a aceitar a única opção data pela empresa: a emissão de voucher, especialmente se a sua intenção seja não viajar mais.
Neste caso, a empresa deverá reembolsar o consumidor integralmente, inclusive com multa, já que o cancelamento ocorreu por culpa da empresa, e não do consumidor.
É o que dispõe o art. 35 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece o seguinte:
Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:
I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;
II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;
III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.
A 123milhas propõe ao consumidor apenas e tão somente a opção do inciso II, ou seja, obriga-o a "aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente".
Frise-se que se o consumidor optar pela emissão do voucher não poderá mais ter o reembolso do valor. Uma coisa ou outra! Por se tratar de um direito disponível (nome utilizado no Direito para descrever aqueles direitos dos quais as pessoas podem livremente negociar), a partir do momento em que o consumidor exerça seu direito a receber um voucher, não poderá exercer outro direito.
A empresa faz uma proposta aparentemente tentadora para os consumidores que optarem pela emissão do voucher: 150% do CDI, que é uma referência utilizada pelo mercado para calcular a rentabilidade dos investimentos em renda fixa. Isto equivale a aproximadamente 20% ao ano, considerando que a taxa SELIC está em patamares superiores a 13%.
O consumidor poderá calcular se compensa receber a taxa oferecida pela empresa, mas terá que utilizá-la num determinado espaço de tempo, e provavelmente para outro destino, ou seja, o voucher não significa que o consumidor poderá embarcar para o destino anteriormente desejado, mas para o que couber no preço estabelecido no voucher. Se no ato da compra estiver mais caro do que o voucher, terá que pagar a diferença.
A estratégia da 123milhas prende o consumidor à incerteza, pois nada garante que ele conseguirá usar seu voucher noutra viagem, mesmo com a correção monetária aplicada (os tais 150% do CDI).
Além do mais, se a empresa sabe que o preço da passagem é bem superior ao que foi pago pelo consumidor e justamente por isso não está conseguindo cumprir com o seu plano promocional, a estratégia de liberar vouchers obriga o consumidor a ter que escolher um outro tipo de viagem que não estava em seus planos.
Navegue pelo site da empresa e você verificará que a multa em caso de cancelamento do contrato pelo consumidor é de 40% sobre o valor pago. Nada justifica que a correção monetária da devolução do voucher seja um valor 50% inferior do que a própria empresa cobra de seus consumidores.
Portanto, por mais atrativo que os 150% do CDI possam parecer, este valor está pelo menos 50% mais baixo do que a multa exigida para cancelamento pelo próprio passageiro, gerando, assim, uma enorme distorção de forças, prevalecendo o maior poder econômico da empresa em detrimento do consumidor, o que não é admitido pelo Direito do Consumidor.
Assim, independentemente do que a 123milhas propõe, é um direito do consumidor exigir a devolução do valor pago, acrescido de multa equivalente ao que é praticado em se tratando de cancelamento a pedido do consumidor.
Caso tenha ficado com alguma dúvida a respeito deste artigo, entre em contato conosco. O escritório Jean Caristina Advogados é especializado em Direito do Consumidor e poderá ajudar você a entender quais as consequências do cancelamento, como calcular o CDI, quais direitos podem ser exercidos na Justiça, o que fazer administrativamente etc. Conheça todas as nossas áreas de atuação no Direito do Consumidor e como podemos te ajudar. Entre em contato agora mesmo e agenda sua consulta.



